I. Porque ecosofia A:
Se toda criança da zona rural tem sua árvore
preferida, a Arvinha é a árvore de minha vida. O "A" é de 'Arvinha',
mas também de 'amor', e da primeira e da última vogal de 'Capivarinha'
e de 'Capelinha'. Arvinha é uma pequena árvore em que eu e meu
irmão vivíamos subindo. Havia várias árvores mais imponentes, como dois ou três
jequitibás bem ao seu lado (talvez por isso ela tenha recebido o nome de
"Arvinha"). Nós preferíamos a Arvinha para brincar, subir em suas
grimpas. Eu imaginava ter uma casa sobre seus galhos. Ela me marcou muito, ao
ponto de tentar fazer um poema em que ela aparece (não sou poeta). É lá que
nosso amigo Osmar chegava para brincar conosco. A Arvinha representa representava
para nós lazer, prazer, brincadeira, liberdade. Hoje sabemos que representava
uma ligação umbilical com a natureza.
Pois bem, o grande filósofo norueguês Arne Dekke
Eide Naess, conhecido simplesmente como Arne Naess (1912-2009), criador da
Ecologia Profunda, tem como um dos princípios fundamentais a autorrealização,
para todos os seres, não apenas para os homens. Autorrealização é procura do
próprio bem-estar, do conforto, enfim, da felicidade. Para mim e meus irmãos, a
Arvinha era parte integrante dessa autorrealização. Ela inclui procurar a
realização pessoal, viver em harmonia com a natureza, o que praticávamos
diariamente, inclusive com a Arvinha. Havia algo como um prazer sensual, quase
erótico. Mas, acima de tudo, estar nos galhos mais altos da Arvinha dava a sensação
de estar no alto, mas não tão alto que representasse perigo, como nos
jequitibás.
A Arvinha ficava em uma posição mais alta do que
nossa casa, bem próxima dela, com o que nos sentíamos seguros e não longe das
vistas de nossos pais. Com isso, nos sentíamos altaneiros, porém seguros.
Se Arne Naess chamava sua ecosofia (filosofia
ecológica) de “ecosofia T”, eu passei a chamar minha filosofia de vida pessoal
de “filosofia A”, tomando o “A” de Arvinha. Vejamos algumas características
dessa “filosofia”:
II. Minhas primeiras premissas: meus princípios
de vida
- Valorizo o "quê", não o "como"
de tudo (comida, sexo, etc.);
- Valorizo a essência, não a aparência;
- Levo as coisas a sério;
- Valorizo as próprias raízes, a origem rural;
- Não gosto de ficar na expectativa, de esperar
por nada nem por ninguém;
- Tenho tolerância e benevolência para com os
fracos, não para com os arrogantes e os prepotentes;
- Não gosto de desperdiçar nada;
- Gosto de momentos de solidão (o indivíduo atual
tem pavor dela);
- Gosto do silêncio (o indivíduo atual tem horror
a ele);
- Gosto de música suave (a maioria dos indivíduos
atuais apreciam música em um nível de decibéis que lesiona os tímpanos);
- Tenho horror ao barulho, porém, os barulhos da
natureza geralmente não me incomodam (trovões, por exemplo);
- Gosto de tomar banho com água em temperatura
ambiente (não quente);
- Não gosto de tomar remédio (muitas dores passam
naturalmente sem eles);
- Não me preocupo com a morte: ela faz parte do
processo natural da vida;
- Não acendo a luz quando a luz do sol ou da lua
é suficiente nem quando não é necessário acendê-la;
- O mínimo me é suficiente; detesto exageros e
ostentação;
- Ninguém é muito importante (figurão,
autoridade) para mim;
- Valorizo todas as formas de vida, todos os
seres; acho que aqueles seres que não valorizam os outros seres (os assassinos,
p. ex.) não merecem viver com os demais;
- Não maltrato os animais, as plantas nem a
natureza mineral;
- Minha maior diversão é o contato direto com a
natureza. Isso traz recompensas imediatas;
- É difícil dizer o que é certo e o que é errado.
Para mim, errado é o que causa sofrimento; certo, o que não o causa. De modo
mais amplo, errado é o que prejudica a vida, no sentido biológico; certo, o que
não a prejudica;
- Considero as "obras de arte da
natureza" mais belas do que as produzidas pelos humanos;
- Formalidade versus disciplina: Há uma
diferença fundamental entre as duas. O formalista nos põe para servir as
regras; o disciplinado põe as regras para nos servir;
- O terrorismo não se justifica em hipótese
nenhuma. Muitos movimentos perdem toda a razão que tinham ao lançar mão da
violência contra inocentes.
Depois, virá mais coisa sobre a Arvinha e a
Ecologia Profunda.
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